Fado, cançao do povo.
Canções que viajam pelo Mar
Os portos de mar sempre foram locais de partida e chegada de pessoas e mercadorias. Mas nos barcos também vinham as culturas e nas cidades portuárias fez-se a sua miscigenação.
Ao longo de séculos, os barcos foram transportando, de porto em porto, traços culturais que criaram as raízes da primeira globalização.
Profundamente ligado à vida marítima e à actividade portuária aparece também o fado. Assim, o fado enquanto expressão de música popular característica e original de Lisboa será inserido no conjunto mais vasto das manifestações culturais com traços semelhantes nascidas em cidades onde também existe uma ligação profunda ao mar.
No século XVIII, criou-se no Brasil um cruzamento de três continentes. O resultado apareceu sob a forma de manifestações culturais novas, que integravam a Europa, a África e a América. A componente africana foi levada pelos escravos negros. A esta misturaram-se traços das culturas ameríndias pré-existentes no Brasil.
A cultura do colonizador europeu, pelo seu lado, contribuiu com as tradições rurais portuguesas e com o barroco. Acrescia ainda o intercâmbio resultante dos contactos portuários que ligavam a Índia, a Ásia e a África. De tudo isto resultaram expressões como as modinhas e o lundum.
No início do século XIX, a corte portuguesa refugiou-se no Brasil na sequência das invasões francesas. O fado passou a integrar influências dos ritmos brasileiros em intercomunicação com a poesia nascida nos bairros populares de Lisboa. Foi também por esta altura que a guitarra de 12 cordas, introduzida pela colónia britânica residente na cidade do Porto, passou a acompanhar o fado. A relação entre a voz e o instrumento passou a ser directa, com o estilo vocal a tornar-se muito expressivo e a equilibrar as deficiências do vocabulário popular.
No século XX, o fado fez a sua estreia no teatro musical e na rádio. O fado das tabernas resistiu às luzes do salão. Mas em 1927 surgiu regulamentação que obrigava à posse de carteira profissional para se cantar em público. Mais tarde, o fado projectou-se internacionalmente como a canção nacional. O fado ganhou espaço na literatura, no cinema e na indústria discográfica, adquirindo uma dimensão nova. Mas permaneceu como expressão musical profundamente relacionada com outras manifestações culturais de cidades portuárias, o que exprime uma relação muito antiga de trocas culturais. Este facto dá ao fado um destaque especial na era da globalização.
A alma dos portugueses
O fado não é apenas uma canção acompanhada à guitarra. É a própria alma do povo português. Ouvindo as palavras de cada fado pode sentir-se a presença do mar, a vida dos marinheiros e pescadores, as ruelas e becos de Lisboa, as despedidas, o infortúnio e a saudade.
A grande companheira do fado é a guitarra portuguesa. Juntos, fado e guitarra, contam a essência de uma história ligada ao mar.O fado, por ser de todos os portugueses, está na taberna e no salão aristocrático. Surgido na primeira metade do século passado, depressa se tornou na canção popular de Lisboa. Desde então, manteve sempre as sua características de expressão de sentimentos associados à fatalidade do destino.
O fado está marcado pelo phatos das tragédias da Grécia clássica.A canção emblemática de Lisboa é também indissociável dos seus bairros mais típicos. Alfama, Mouraria, Bairro Alto e Madragoa são os seus mais autênticos berços. Por esta razão, ouvir o fado é conhecer Lisboa. É também conhecer os portugueses, no mais profundo da sua alma de povo que enfrentou o mar desconhecido.E, por ser uma canção nacional, o fado está igualmente marcado pelo atracção que a aristocracia boémia sentiu pela ruas e vielas de Lisboa, pelas tabernas e pelas mulheres. O fado foi partilhado por fidalgos, por vadios e por marinheiros. No regresso ao salão aristocrata, trouxeram o fado para que fosse acompanhado ao piano.
A companheira do fadoA guitarra portuguesa é a grande companheira do fado. A sua origem remonta ao cistro surgido na França e na Itália do Renascimento.O cistro viajou desde o século XVI pela Alemanha e pela Inglaterra, tendo sido intro-duzido em Portugal pela colónia britânica radicada na cidade do Porto.
Abandonada nos outros países europeus, a guitarra adaptou-se e criou raízes em Portugal. A sua evolução deu-lhe características próprias, passando a ser designada por guitarra portuguesa.
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